(Atenas...)
Meu caro padre Manuel
Escrevo-te assim, para este nome, como se não existisses,
existindo mesmo, como que a querer disfarçar a ideia que te quero mandar mas
que tanto poderia ser mandada a ti ou um outro qualquer com este nome ou que
tivesse como missão as missões que hoje tens…
De qualquer modo, mesmo que não to tenha dito pessoalmente, o
que aqui escrevo, acredito, é feito com a maior das amizades e no intuito de
construir o que, acredito, continua a ser proposta para ajudar gente boa a ser
maior!!! (Não sei se este texto a ti chegará mas chegará a muitos que me
permitirão concluir e reflectir sobre o que aqui ficará escrito).
Fui-me habituando, à medida que os anos passavam sobre o meu “abandono
do exercício do sacerdócio” a perceber que as dinâmicas de então ou as lógicas
que inspiraram determinados agires terão, hoje, de ser diferentes.
(Por muito visionário e inovador que me considere, consigo obrigar-me a essa ressalva/reserva moral).
(Por muito visionário e inovador que me considere, consigo obrigar-me a essa ressalva/reserva moral).
Contudo, certamente pelo orgulho que me acompanha, ao qual se
junta a presunção de ter feito, em alguns campos, mais do que permitia a eclesialidade
humana, não esquecendo os fulgores da juventude de então, e as opções na
concretização do exercício do ministério tentando a fidelidade à natureza do ser
Igreja criando Comunhão e comunidades por onde quer que passasse… a verdade é
que, ano após ano, assim se foi construindo aquilo que desde a sua origem
era denominado como um projecto de projectos… CAES de seu nome.
O meu abandono fez-me temer que muitos dos que comigo tinham
permitido a dinâmica do espaço e dos espaços se fossem embora . Mas assim não
foi. Mais, ficaram por vários anos a alimentar as forças e as ideias de quem
veio depois, e a dar espaço para que outras dinâmicas se criassem e outras
pessoas (estudantes) se envolvessem.
Não sei o que se passou. Sei que manifestei a minha
disponibilidade para explicar o porquê de algumas iniciativas mas tal nunca foi
necessário. Duvido se pela falta da necessidade, se porque a minha matriz,
talvez se julgasse, estar errada.
Ou então, porque simplesmente deixara de ser referência com
efeitos retroactivos…
O que sei, e recordo apenas dois momentos especiais: a
celebração aos Domingos, apelidada de Missa dos Estudantes e a Bênção dos
Caloiros (recordar estes dois momentos celebrativos da fé não é pura
ingenuidade, é mesmo afirmação dos equívocos dessa pastoral dita do ensino
superior que deve superar o anseio de catequisar os seus destinatários, ousando
ser um pouco mais, julgo, acredito e nessa lógica trabalhei).
A missa dos estudantes começa, na Igreja do Espírito Santo;
como proposta em 1996 ainda com o Pe. Manuel Armindo. Em 1997, com a ida “do Armindo”
para Roma foi-me entregue esse serviço da pastoral do ensino superior (entre
outros).
Uma das iniciativas (ou projectos, uso a palavra porque sublinho
o facto de nada crescer sem paciência e muito trabalho) que logo abracei foi a
celebração aos domingos…
-mesmo que com meia dúzia de participantes,
-mesmo que fosse uma dor de cabeça arranjar grupo que a
dinamizasse,
-mesmo que as homilias
por vezes não fossem as adequadas,
-mesmo que a angústia de procurar sempre algo novo fosse
dilacerante…
Sabia que, tanto eu como o projecto, estávamos a crescer e a percorrer
caminhos novos… até em Leiria, ou sobretudo em Leiria!!! Com gente de Leiria e
de fora de Leiria, mas em Leiria!!!
Essa cidade órfã de um padre Amaro ( e eu mais tarde serei
mais um dos que abandonará o ministério, com uma história mais “bonita do
que a do Amaro”, penso, e estou disposto
a discutir o assunto com quem quer que seja) para alimentar o seu
anticlericalismo e as piadas brejeiras mas que continua a viver dependente das
horas de ir levar os filhos/netos à catequese ou de os ir buscar às actividades
do escutismo católico para depois se preparar para a reunião da loja maçónica,
se afirmar como independente e laico e achar vergonhosa a riqueza da "Igreja", ou, sendo
mais simples: coisas que os leirienses conseguem digerir com a maior das
facilidades…
A Bênção dos Caloiros, surge mais tarde. Já fruto de uma
constatação a a partir de uma regra de oiro no trabalho com os estudantes.
As Bênçãos dos Finalistas muito concorridas por familiares e
amigos dos estudantes tinham uma exigência: não havia artistas convidados. Ou
seja, tudo era feito pelos protagonistas… os estudantes. O que obrigava a
muitas reuniões com as comissões de finalistas, com as equipas de elaboração
dos textos da celebração, a repetir ensaios e mais ensaios para o coro
improvisado ano após ano.
A verdade é que valia a pena, e valia sobretudo pelos
estudantes com quem se aprofundava o relação e se descobria, tantas vezes, por
aí terem andado e não termos tido a oportunidade de caminhar juntos mais cedo e
não apenas na hora do adeus à cidade… Foi assim que nasceu a ideia da Bênção
dos Caloiros…
No ano da chegada a Leiria ou do início dos estudos do Ensino
Superior, promover uma celebração em que, não havendo artistas convidados, se fazia
acontecer um momento marcante na vida dos que estavam a iniciar o seu percurso
académico.
O facto de se ter proposto o pijama como “farda” do momento
vinha na continuidade do que acontecia em dias de praxe em que os caloiros eram
“obrigados” a esse vestir nas próprias escolas.
Mais reuniões, comissões de praxe, grupo de textos, coro da celebração
e, sobretudo, a solidificação de um projecto de projectos pelo envolvimento
maior dos jovens estudantes que cresciam na cidade.
E as coisas começaram a correr bem. E correram. Penso.
O que
me leva agora a escrever estas palavras!? Sobretudo o desejo de partilhar esses
tempos de então, talvez inspirados pela euforia transversal a tantas outras
realidades humanas (pré-neoliberais e típicos pós-modernos!!!???) e também, e sobretudo, o querer dizer que acabar com algumas coisas é
muito fácil. Basta uma decisão, sobretudo se for de uns iluminados que sabem
sempre o que os outros fizeram bem ou mal, ou como deveriam ter feito bem mas
fizeram mal. Construí-las demora um pouco mais e implica sabe Deus o quê. Tenho
a certeza de uma: implica-nos!!!
Abraço Pe.Manuel e bom trabalho!
PS. Escrevi este texto no dia do Pai. Já não o tenho comigo,
o meu. Já o fui no passado dessa forma ministerial e sou-o agora
biologicamente. De todas essas vivências recolhi uma missão que acredito
enxertada na vivência da fé: não há maior missão do que ser construtor de comunhão
e de comunidades, sobretudo quando elas não nos são dadas pré-feitas…
Bom caminho!!!
5 comentários:
Li até ao fim!
Obrigado!
Compreendo o que dizes e o mérito foi-te sempre reconhecido e muito do que sou devo a ti e sabes disso.
Mas não posso deixar de manifestar a minha opinião quanto ao trabalho que tem sido feito.
Infelizmente, a tua saída abalou não só o processo mas as pessoas que estavam diretamente ligadas. O motor deixou de existir e ainda que temporariamente tivéssemos ficado sozinhos, isso trouxe naturalmente consequências e resistências a quem quer que viesse.
Não podemos culpar quem veio ou quem foi, até porque a equipa ficou lá para continuar trabalho. E acredita que esforços não faltaram para conseguir ultrapassar a tua saída.
Continuo a trabalhar com jovens, estou nisto há quase 12 anos e vejo que existem coisas que são geracionais, e aquilo que resultava há uns anos não resulta agora. Todos somos diferentes e temos de saber adaptar-nos à realidade que existe.
Tenho ido à missa na igreja Espírito Santo e, apesar dos esforços, as pessoas que vão àquela missa são os adultos que outrora foram adolescentes que estudaram nesta cidade e que mantiveram aquela rotina. Eu própria sou um exemplo disso. Não estou a dizer que deve acabar, mas continuar a chamar "Missa do Estudante"... não faz sentido.
Há pouco tempo em conversa com uma colega que dá aulas no superior há 20 anos, (uma colega que leva a sua missão com afinco e empenho), afirma que há uma alienação e apatia a tudo. Não quero generalizar porque há pessoas que não o são. Temos de analisar a "big picture" e não, aquilo que já foi e já não o é... Todas as ações criam reações. Sendo eu crente no amor de Deus, sinto que todos nós devemos agir e ser em Deus. Tudo o que faço na pastoral é baseado nisto e todas as decisões tomadas são pensadas e refletidas! Não se trata de descrédito daquilo que deixaste mas adaptar e mudar as coisas à realidade que existe e se impõe.
Não concordo com a tua análise da realidade... mas nisso tens mais argumentos que eu. O que me parece é que a visão de qualquer pessoa sobre a realidade também poderá ser influenciada pelo tipo de trabalho desenvolvido ou que se está disposto a desenvolver...
Quanto à alienação dita "actual"... penso-a mais velha que a Sé de Braga... o trabalho pastoral é contornar isso memso... ou poderá ser... ou terá de ser...
Jinhos e abraços
E quando digo isto "a visão de qualquer pessoa sobre a realidade também poderá ser influenciada pelo tipo de trabalho desenvolvido ou que se está disposto a desenvolver..." não penso na TUA disponibilidade mas na disponibilidade de toda uma equipa/serviço... aqui parece-me estar o Busilis da questão OVO COZIDO!!!
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